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Ivo Herzog

Londres, 1966
Engenheiro
Entrevista concedida em 2019

Ivo Herzog é engenheiro e um dos fundadores do Instituto Vladimir Herzog. Nasceu em Londres no dia 31 de agosto de 1966, filho de Vladimir e Clarice Herzog. Ivo nos conta como sua infância, até então parecida com a de qualquer garoto, foi modificada em poucos dias, entre o enterro do pai até o culto ecumênico celebrado em sua memória.

Transcrição: 

Então, o que eu falo? Até o dia 25 de outubro “I was an ordinary child”, uma criança comum, como qualquer outra. Não sabia o que estava acontecendo no mundo, nada. Meus pais tinham um emprego, eu tinha nove anos e meu irmão tinha sete. No dia 26 minha mãe fala que meu pai morreu. Ela diz que contou uma história lá que eu não me lembro, que tinha sido um acidente, eu não lembro disso. Eu nunca vi meu pai morto, até pela tradição da religião judaica. Eu começo a perceber que tem alguma coisa errada no dia 27, que é o dia do enterro, já no velório, porque tem um assédio descomunal. Não era família que estava lá, estava família e mais mil pessoas, televisão, não sei o que, tal. 

Eu acho que muito até desse processo aí de somatização que eu tive tem a ver com o que aconteceu do dia 27 ao dia 31 de outubro. Que uma criança de nove anos, num período muito curto, recebeu uma enxurrada imensurável de fatos, de informações. Meu pai morreu, aconteceu tudo isso, tenta enterrar meu pai com pressa, minha mãe aos berros não deixa, o desespero dela, as outras pessoas, Praça da Sé… então ali é que entortou os neurônios. 

E eu tive uma ilusão, que ficou por muitos anos, de que o meu pai não tinha morrido. Ele era um desaparecido e um dia ele ia voltar. Eu não tinha nenhuma prova material do contrário. E não só isso: depois que o meu pai morre, teve o processo de blindagem da minha mãe. Então, assim: o caso Herzog estava posto, ela não queria que a gente tivesse contato com as imagens chocantes. Nunca tivemos. A primeira vez que apareceram umas imagens mais chocantes foi na revista Veja, que tem o rosto do meu pai na capa. O Vera Cruz tinha aquela coisa que o recreio era aberto, uma banquinha de jornal, padaria e tal, e ela falou assim: “Olha, vai ter essa revista, vai ter o rosto do seu pai, e eu gostaria que vocês não olhassem”. Eu até hoje não olhei essa revista. E o próprio Instituto não tem nenhuma foto do meu pai morto.

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